NÍSIA FLORESTA – 210 ANOS DO NASCIMENTO


Por: Carlos Alberto de Assis Cavalcanti

Ao professor: Raul Guilherme M. Silva – ETE – Jonas Costa)

Vou contar, num Cordel decassilábico, 
um pouco do que foi muito na vida
a vida de quem foi mui destemida
qual beduíno a pé em solo arábico.
Ela fez sabichão ficar estrábico
ao ler os seus escritos avançados
no tempo em que governos atrasados
e alguns homens machistas ditadores
proibiam às mulheres os labores
para além dos domésticos legados.

Era um tempo emblemático na História,
um século em ocaso e outro surgindo,
XIX abre a XX, que vem vindo,
os fatos que registram a memória
e definiram perdas ou vitória
da humanidade ao longo do percurso
em que o Poder ditou o seu discurso
e amordaçou a voz que vem do povo
por temer que surgisse algum renovo
iluminando as gentes no seu curso.

Revolução francesa: foi notório
o perfil masculino preservado,
teve o homem o Direito declarado
e à mulher um “direito” provisório,
quando então um panfleto decisório
contestou essa tal Declaração
pela voz feminina da Nação:
Olympe de Gouges ao cadafalso
e enfrentou com firmeza a cada falso
que lhe tirou a vida sem razão.

Resquícios de Colônia e Monarquia
demarcavam o Brasil de XIX,
o olhar patriarcal é que promove
a Lei que determina a mais valia
sobre a vida refém de quem podia
dar as ordens cabais e autoritárias
nesse tempo de vidas sedentárias
ou escravas, servis e submissas,
a ouvir catecismos lá nas missas
e nas casas as regras que eram várias.

Nasceu Nísia Floresta Brasileira
em Papari, no Estado Potiguar,
onde viu sua vida desaguar
mil sonhos entre a luta na poeira
do sertão onde a fé da rezadeira
faz pedido ao Divino pra que chova,
e a nuvem abençoada então promova
o aguaceiro que traz ao solo duro
o fruto que, crescido e já maduro,
ao povo dê sustança e à vida mova.

À frente do seu tempo, sempre Augusta,
cresceu Nísia Floresta educadora,
poeta, feminista e escritora,
que sonha uma Nação livre e robusta
que a divisão do pão sempre se ajusta.
Se a educação é livre, entre os patrícios,
em cada mesa o pão livra dos vícios
que sepultam as vidas infelizes,
pois não foram das letras aprendizes,
não fizeram na Escola os exercícios.

Família itinerante, segue o pai
que em Pernambuco mora e é assassinado.
Se vê o coração dela enlutado
e a família abalada logo vai
morar entre os gaúchos onde cai
mais uma vida amada da família:
o seu jovem marido. E ela, em vigília,
assume a direção de sua prole.
Para encontrar coragem, que a controle,
vai meditar à sombra de uma Tília.

Era um tempo de atraso e duras lutas
onde a mulher, sem voz, era oprimida
pela voz que soava desprovida
de Justiça, por crer nas forças brutas
dos mandantes nas casas ou nas grutas
que faziam valer, por meio injusto,
seus valores sem Lei a todo custo
pra fazer de uma prática machista
a mulher ser menor e ser mal vista
num contexto em que o homem se acha justo.

Como Lila Ripoll e Elvira Pinho,
uma gaúcha e a outra cearense,
Nísia Floresta assim também pertence
ao grupo que mudou d’água pro vinho
a História da mulher que deixa o ninho
onde as ordens impedem a inteligência
da mulher se fazer em evidência
no cenário da vida social
e no ceio da vida cultural
que evolui nas passadas da Ciência.

Primeira feminista do Brasil,
mulher protagonista e emancipada,
Nísia teve matéria publicada,
cujo assunto discute o ser servil
que era a mulher aos olhos do ser vil
nas culturas de tempos bem remotos;
logo estreia o seu livro em texto e fotos
e analisa os Direitos das Mulheres,
por que somente à casa os seus misteres
e sequer contam delas os seus votos?

São catorze obras suas numa lista
dos livros publicados na Editora,
nos quais o seu talento de escritora
confirma a sua veia de analista
dum Brasil de perfil capitalista,
migrando do rural pro mundo urbano
em que grupos disputam algum plano,
preferindo enricar do que educar,
e o Brasil ser ração pra manducar
nos manjares servidos ao tirano.

Onde Nísia passou em seu percurso
uma Escola fundou que manifeste
no Nordeste, no Sul e no Sudeste
a raiz do Saber em cada Curso
que à mulher implantou novo discurso
pra quebrar o silêncio a ela imposto
que a mantinha refém lá no seu posto
de Rainha do Lar, mas sempre escrava
do Rei-mor que mil regras lhe ditava
pra mantê-la a seus pés, sempre a seu gosto.

Nísia esteve um bom tempo na Europa
alargando os saberes e a escrita,
sempre atenta ao Brasil, vivia aflita
por saber que o Império e sua tropa
perseguia a cultura de quem topa
renovar as ideias sociais,
superando as barreiras raciais
entre os brancos, os índios e os escravos,
pois não há como ter heróis e bravos
onde muitos têm menos e outros mais.

Viu o amigo francês Auguste Comte,
com quem ela trocara tantas cartas,
e cidades onde há culturas fartas;
visitou a museus, sublime fonte
onde há sempre uma história que se conte
sobre a História dos povos noutras eras
em que alguns sucumbiram nas esperas
por um dia gozar da liberdade
e viver entre todos na igualdade
em que sejam as ações sempre sinceras.

Ao findar os seus dias lá na França,
ao mundo deixou Nísia seu legado
em cada livro seu já publicado
e em cada ensino seu que ao outro alcança,
pois Nísia foi a festa e foi a dança,
Floresta que nasceu lá no deserto,
Brasileira que faz valer o certo, 
Augusta nas ideias libertárias,
fez que as mulheres, mais que necessárias,
conquistassem o valor dantes incerto.

Papari adotou Nísia Floresta,
a filha empresta à mãe o próprio nome
para fazer valer o seu renome
e projetar a filha sempre em festa
pela vitória contra cada aresta 
que separou as vidas, no passado,
por um critério já ultrapassado
que o machismo vigente adotava
por temer a mulher que desbravava
novos tempos a cada passo dado.

Com prazer discorri, neste Cordel,
sobre a autora do livro dos “Direitos
das Mulheres”, escritos escorreitos 
qual faz um escultor no seu papel
ao talhar a escultura com cinzel,
verteu ela do Inglês a obra lida
de uma autora de lá, mui destemida.
Que Nísia, cuja vida celebramos
e a quem este Cordel lhe dedicamos,
receba esta homenagem merecida!

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