ARCOVERDE: A CALÇADA FICA DESCALÇA SEM SEU "NATAL"


OS SAPATEIROS

Os sapateiros da Av. Japiassu se arranjam nas calçadas em seus ateliês à espera de clientes. Uns chegam trazendo sapatos bem rodados na vida dura de quem anda sempre a pé; já carregaram exaustivamente seus donos rua afora, querem um novo solado. 

Os sapateiros têm seus truques para restaurar velhos sapatos que já deixaram muitos rastros pelas ruas da cidade e, agora, gastos, pedem clemência. 
Os sapatos são recebidos no ateliê escolhido e, após um rápido exame, logo é indicado ao cliente que tipo de tratamento os sapatos vão receber: a uns, uma nova sola seguida de uma sova de marteladas pontuais; a outros, uma sessão de acupuntura com pregos. 

Os sapateiros são saparteiros, fazem o parto de sapatos grávidos de tempo de uso; ou talvez sejam fisioterapeutas, recuperam sapatos lesionados pelos vícios de postura dos donos. 

Às vezes, ocorre uma troca involuntária na devolução e aí os sapatos vão parar em outros pés. Isso só não ocorre com os sapatos de políticos, pois todos calçam 40...

Há aqueles que são deixados de lado, excluídos da convivência com os pés que tanto ajudaram a andar; (quem sabe, os calos sejam uma vingança)! 

Os sapatos querem voltar, novos, à rotina de transportar o seu dono pelas trilhas das calçadas do centro ou dos bairros; os sapatos ficam felizes por saírem daquele cativeiro e agora, livres, vão andar na fila dos bancos, vão desfilar nas festas públicas ou em lugares menos públicos (da difícil vida fácil).

Não importa o trajeto, qualquer um é melhor do que ficar parado nas mãos do sapateiro. Sapatos gostam de andar. Inda mais quando o ateliê fica na calçada de uma Sapataria onde os sapatos novos, na vitrine, debocham dos seus sósias na calçada. Até entre os sapatos há classes sociais: uns são CHIC, outros nem tanto...

Este texto faz parte do livro/artigo RECORTES (EM PROSA E VERSO) DA HISTÓRIA DE ARCOVERDE, publicado em 2018 pelo professor, poeta e escritor Carlos Alberto de Assis Cavalcanti.

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