SETEMBRO AMARELO: SUICÍDIO, BREVE OLHAR PSICANALÍTICO

A palavra suicídio deriva do latim sui (si mesmo) e caederes (ação de matar), ou seja, é um gesto de autodestruição, realização do desejo de morrer ou dar fim à própria vida. O suicídio é um fenômeno complexo e causado por vários fatores que pode afetar indivíduos de diferentes origens, faixas etárias, condições socioeconômicas, orientações sexuais e identidades de gênero. Mas o suicídio pode ser prevenido, e saber reconhecer os sinais de alerta é o primeiro passo.

No Brasil a média é de 6 a 7 mortes por 100 mil habitantes, bem abaixo da média mundial que é entre 13 e 14 mortes por 100 mil pessoas. O que preocupa é que, enquanto a média mundial permanece estável, esse número tem crescido no Brasil e o maior aumento é registrado entre jovens de 15 a 25 anos. Os homens normalmente se matam mais, embora as mulheres tentem mais vezes. Outro dado relevante é que homossexuais, bissexuais e transexuais têm índices maiores de suicídio, talvez essas tendências estão ligadas a causas culturais e preconceitos sociais. A cada 40 segundos uma pessoa se mata no mundo, totalizando quase um milhão de pessoas todos os anos, de modo que estima-se que de 10 a 20 milhões de pessoas tentam o suicídio a cada ano. Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), 90% dos casos de suicídio podem ser prevenidos. Também é preciso ter atenção as pessoas que convivem com o suicida, pois a cada suicídio de 6 a 10 pessoas são diretamente impactadas sofrendo sérias consequências difíceis de serem reparadas.

O ser humano é o único ser vivo capaz de dar fim à própria vida, também é o único que possui linguagem, talvez aí esteja uma pista. Dentro da psicanálise existem muitas explicações, já que o sujeito é singular, não pode haver apenas uma resposta. Diante da impossibilidade de atender as demandas de uma sociedade que tem como ideal a felicidade, a morte pode no íntimo de cada sujeito aparecer como uma alternativa. Porém, existe um paradoxo, pois segundo Freud “é impossível imaginar nossa própria morte e, sempre que tentamos fazê-lo, podemos perceber que ainda estamos presentes como espectadores. Por isso, a escola psicanalítica pôde aventurar-se a afirmar que no fundo ninguém crê na própria morte, ou, dizendo a mesma coisa de outra maneira, que no inconsciente cada um de nós está convencido de sua própria imortalidade” (Freud, 1915).

Portanto, se no inconsciente não existe uma representação da própria morte, como podemos pensar o suicídio por um prisma psicanalítico? O que leva um indivíduo escolher a própria morte? Será ela uma escolha? Conforme Cassorla, “o suicida não quer morrer – na verdade ele não sabe o que é a morte. Aliás, ninguém sabe. O que ele deseja é fugir do sofrimento” (Cassorla, 1991). Assim, podemos entender, segundo Cassorla que na verdade o suicida não busca a morte com seu ato, porém ele almeja é uma fuga desse sofrimento insuportável que o impede de viver; o suicídio aparece como única saída. Assim sendo, não existe uma única justificativa para esse ato, pois ele é singular, insto é, tem relação com a história de cada sujeito e sua constituição subjetiva. A ocorrência ou não do suicídio vai depender das condições simbólicas do sujeito, ou seja, da sua capacidade de lidar com o que lhe causa mal-estar; se ele irá responder pela via do real com a morte ou buscar elaborar por meio da palavra.

Numa perspectiva lacaniana, o suicídio pode ser pensado enquanto um ato que vem no lugar de dizer. “Não basta um fazer para que haja ato, não basta que haja movimento, ação; é preciso que haja também um dizer que marque e que fixe esse ato”. (Farah, 2000). Segundo o psicanalista francês Jacques Lacan no seminário 10 existem três características principais presentes no ato. A primeira se refere a linguagem, aquilo que é impossível de ser dito, acaba por ser atuado. Já a segunda característica se refere à mudança, pois depois que o ato acontece não há como voltar atrás, depois disso o sujeito não será o mesmo. A terceira diz respeito ao ato ser acéfalo, levando em conta que nele o sujeito não se reconhece, o sujeito do inconsciente não se faz presente no ato. Com o auxílio de um profissional especializado, o sujeito através da fala será capaz de compreender melhor a importância dos fatores envolvidos em seu sofrimento.

O sofrimento pode se tornar suportável se o indivíduo puder contar com a ajuda de outro ser humano, um profissional especializado em sofrimento que utilizará seu conhecimento para compreender esse mal-estar e ajudar a transformá-lo, ressignifica-lo. Muitas pessoas que pensam em suicídio estão descrentes e não conseguem ver nenhuma saída, porém essas saídas existem e podem ser encontradas desde que se deixe ser ajudadas. É preciso deixar de ter medo de falar sobre o assunto, derrubar tabus e compartilhar informações ligadas ao tema. As ideias suicidas e tentativas de morte são formas de pedir ajuda. Especialistas em saúde mental podem identificar sintomas de transtornos mentais na maioria das pessoas que optaram pelo suicídio.

Você não está sozinho! Falar é a melhor solução!

Dr. Daniel Lima (Psicanalista e Filósofo, Pós-graduando em Psicanálise e Teoria Analítica – FATIN, Pós-Graduando em Filosofia e Autoconhecimento – PUC-RS).

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